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O Academismo dos Anos 20

  • Foto do escritor: Salão 31
    Salão 31
  • 21 de ago. de 2023
  • 3 min de leitura

Atualizado: 26 de out. de 2023

Nos anos 20, o mercado de arte era incipiente, como o atesta Quirino Campofiorito [4]:

Na época existiam alguns colecionadores, e todos muito conservadores, muito ligados à arte, à pintura tradicional, evoluindo muito vagarosamente. Os colecionadores jamais acreditavam nos jovens, o homem tinha que envelhecer, chegar aos 40, 45 para então o colecionador achar que estava fazendo alguma coisa que pudesse ser comprada... Não havia comércio de arte.

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Café Gaúcho, Rio de Janeiro

A produção artística não atingia a formalização social e sua circulação se dava em nível precário. Os primeiros movimentos de rebeldia contra o neoclassicismo vigente podem ser vislumbrados pelo olhar de José Maria dos Reis Junior através de sua entrevista [5], reproduzida parcialmente a seguir:


O movimento começou aqui (no Rio) antes que em São Paulo, [..] foi feito pelos artistas, não pelos intelectuais [...], mais ou menos em 1918–1919. A turma se reunia no Café Gaúcho [...] discutindo arte [...] Dali surgiu a ideia de fazer um Salão independente do Salão oficial [...] Dali saiu o 1º Salão da Primavera, com tendência mais aberta, sem júri [...] no antigo Liceu de Artes e Ofícios (1923) [...] Aí começou um certo movimento diferente daquele academicismo da Escola.


A atmosfera do mercado de arte dos anos 20 é revelada em artigo por Manuel Bandeira [6] em que dá suas impressões sobre o Salão de 1928 [7]:

O Salão é uma galeria grotesca aonde vou mais para exercer o senso humorístico. Não me pode interessar de outra maneira aquela exibição de um monótono realismo anedótico. Os pintores que admiro são outros e não expõem na Escola. Tarsila do Amaral, Ismael Nery, Di Cavalcanti, Gomide, Cícero Dias, é nos quadros destes que encontro fantasia plástica, emoção, poesia.

Sob o ponto de vista mais objetivo, o poeta informa que a burguesia endinheirada não adquire quadros porque sofre influência de uma única galeria existente, a Galeria Jorge. Por outro lado, as obras consideradas aceitáveis pelo Salão "não passam de aleijões repulsivos".


Nesse ambiente, onde as novidades demoravam a chegar e as informações eram escassas, a Galeria Jorge negociava arte importada ou obras de alguns artistas brasileiros já consagrados.


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Antônio Bento (1902 – 1988)

A crítica se exercia exclusivamente em jornais e revistas, com o objetivo de educar o olhar do público, e nos discursos de abertura dos Salões. Durante todo esse período, a Escola permanece como controladora do monopólio de consagração dos produtores de arte. Assim Antônio Bento descreve o mercado de arte no final da década de 20 [8]:

Na medida em que o Brasil se desenvolve economicamente, se desenvolve o mercado de arte; uma coisa está sujeita à outra. Era e é um país subdesenvolvido. A arte mais do que nunca está ligada à sociedade de consumo. Em 1928/29, só poucos artistas vendiam. Ismael foi um artista maldito, o primeiro quadro que venderia na sua vida foi ao Graça Aranha, mas por uma questão de escrúpulo disse: ‘Não, eu absolutamente não vou cobrar; ele é o chefe do movimento modernista e eu não vou cobrar’. Assim ele nunca vendeu um quadro; era uma pessoa muito desprendida.

- Uma exposição no Brasil, como tem que ser? - Tragam santos e nus.


Theodor Heuberger, ao chegar ao Brasil em 1924, nos oferece uma visão bem pitoresca do mercado de arte, quando fez sua 1ª Exposição de Arte e Artesanato Alemão no mesmo ano, no Liceu de Artes e Ofícios [9]:

(...) eu perguntei: ‘Uma exposição no Brasil, como tem que ser?’ E nos responderam: ‘Tragam santos e nus’. E o mais engraçado, não compraram nem santos nem nus. Santos já tinham demais e nus não podiam comprar porque a mulher brigava. Compraram paisagens de neve que não conheciam, mas acharam bonito. Os melhores compradores foram mesmo os alemães, austríacos e suíços. Os brasileiros preferiam cenas de neve e interiores da casa dos reis da Baviera e natureza-morta.

[4] Trecho da entrevista de Quirino Campofiorito (1902-1993) para o Projeto Portinari. Niterói, 3 de novembro de 1982.

[5] Trecho da entrevista do Professor José Maria dos Reis Júnior (1903–1985) para a Pesquisa Guignard. Rio de Janeiro, 28 de agosto de 1982.

[6] Manuel Bandeira: http://www.academia.org.br/academicos/manuel-bandeira/biografia. As biografias de Manuel Bandeira não contemplam a sua atuação como articulador da organização do Salão de 31. Os seguintes três artigos de sua autoria não deixam dúvida sobre seu engajamento nesse evento: O "Salão dos Tenentes" (São Paulo: DIÁRIO NACIONAL, 05/09/1931), "O Brasil que insiste em pintar" (São Paulo: A PROVÍNCIA, 13/09/1928), e "A revolução e as belas-artes" (Rio de Janeiro: PARA TODOS, 26/09/1931).

[7] BANDEIRA, Manuel. O Brasil que insiste em pintar. A Província. São Paulo, 13 set. 1928.

[8] Trechos da Entrevista de Antônio Bento (1902–1988) para Lúcia de Meira Lima e Maria Cristina Burlamaqui. Rio de Janeiro, 6 de janeiro de 1982

[9] Trecho da Entrevista de Theodor Heuberger (Munique – 1898-1983) para Maria Cristina Burlamaqui. Teresópolis, 8 de janeiro de 1983.

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